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Especialistas publicam consenso inédito para a América Latina de tratamento de pacientes com câncer de cabeça e pescoço

Um estudo que estabeleceu uma diretriz latino-americana para o cuidado de pacientes com câncer de cabeça e pescoço e que apresentou evidências do manejo do carcinoma espinocelular (CEC) de cabeça e pescoço, considerando a disponibilidade no serviço de referência e o benefício oncológico para cada paciente.


Dr. Luiz Paulo Kowalski

Trata-se do Latin American Consensus on the Treatment of Head and Neck Cancer, publicado no JCO Global Oncology.


Na metodologia adotada, um painel composto por 41 especialistas em câncer de cabeça e pescoço apresentou suas respostas baseadas em evidências para diferentes questões contextualizadas pela disponibilidade de recursos e benefícios oncológicos em relação à América Latina, região descrita pelos autores como sendo de recursos limitados e/ou sem acesso a toda a infraestrutura necessária do sistema de saúde).

 

Após as respostas, houve a revisão e classificação dos níveis de evidência e graus de recomendações, seguido de validação do consenso através de duas rodadas de pesquisas online e composição manuscrita.


O consenso consiste em 12 seções: Estadiamento do câncer de cabeça e pescoço, Avaliação histopatológica do câncer de cabeça e pescoço, Cirurgia de cabeça e pescoço - cavidade oral, Oncologia clínica - cavidade oral, Cirurgia de cabeça e pescoço - orofaringe, Oncologia clínica - orofaringe, Cabeça e pescoço cirurgia - laringe, cirurgia de cabeça e pescoço - laringe / hipofaringe, oncologia clínica - laringe / hipofaringe, oncologia clínica - câncer de cabeça e pescoço.

 

No consenso, foram estabelecidas 48 recomendações com base no contexto latino-americano, sem o objetivo de fornecer uma estratificação de diferentes possibilidades de acordo com configurações de recursos ou outras variáveis, como disponibilidade ou experiência dos médicos, por exemplo.


Os leitores devem considerar estas limitações ao aplicar as recomendações aos seus cenários clínicos. “Na literatura médica é mais comum haver consensos com diretrizes para países da América do Norte, parte da Europa e Ásia. É fundamental a publicação de trabalhos como esses, que se apoia em nossa realidade. E podemos extrapolar as recomendações para outras regiões do mundo com cenário semelhante ao dos países da América Latina”, ressalta o cirurgião oncológico Dr. Luiz Paulo Kowalski, que é um dos autores.

 


RECOMENDAÇÕES RELACIONADAS COM A CIRURGIA

 

Dentre as 48 recomendações, estão alguns focadas no papel da cirurgia de cabeça e pescoço, direcionadas para tumores malignos da cavidade oral, orofaringe, laringe e laringe/orofaringe e reconstrução/reabilitação. Para entendimento do nível de evidência e recomendação, é válido observar: Nível de evidência 1 (Revisão sistemática com meta-análise ou estudo randomizado com amostra adequada); evidência 2 (estudo randomizado com amostra não calculada ou inadequada), evidência 3 (estudo prospectivo não randomizado ou estudo randomizado não padronizado) e evidência 4 (estudo retrospectivo). Os níveis de recomendação são A (muito forte), B (forte), C (moderado) e D (fraco). 

 

CAVIDADE ORAL


- A biópsia de linfonodo sentinela deve ser empregada em pacientes com carcinoma espinocelular (CEC) oral em estágios I e II quando todos os recursos, como imagem pré-operatória adequada, radiologista especializado em câncer de cabeça e pescoço, serviços de medicina nuclear, marcadores radiomarcados, patologista adequado e técnicas de imuno-histoquímica, estiverem disponíveis. Caso contrário, a dissecação seletiva de pescoço (SND) deverá continuar a ser o padrão de tratamento para esses pacientes. A vigilância ativa do pescoço não deve ser recomendada.  Evidência e recomendação 1A.


- Um número de linfonodos superior a 18 em um esvaziamento cervical é uma métrica de qualidade em cirurgia de cabeça e pescoço. A técnica cirúrgica pode impactar significativamente o número de linfonodos dissecados, mas também é possível melhorar esta avaliação com a aplicação de um processamento mais rigoroso da amostra pela equipe de patologia. Posteriormente, esta medida poderia produzir um estadiamento nodal mais preciso e, em última análise, conduzir a um uso mais apropriado da terapia adjuvante. Evidência e recomendação 4B.


- Esvaziamento cervical seletivo (ECS) é uma alternativa aceitável para dissecção cervical radical clássico ou modificado (ECR) em pacientes com CEC de cavidade oral em estágio T1 ou T2 e cN1 e para casos muito selecionados de cN2, localizados nos níveis I ou II. No entanto, ECR é o tratamento padrão em pacientes com câncer bucal com doença em estágio T avançado (T3 ou T4) ou doença cN2 e cN3, que requerem tratamento cirúrgico primário. Evidência e recomendação 1B.



OROFARINGE


- Abordagens transorais (TORS ou TLM) com ou sem esvaziamento cervical e radioterapia ou quimiorradiação adjuvante devem ser usadas no CEC de orofaringe T1-2 N0-2 e podem ser usadas em casos selecionados de CEC de orofaringe T3 N0-2, independentemente do status do HPV. A cirurgia transoral convencional deve ser utilizada em casos sem disponibilidade de ferramentas robóticas ou quando um cirurgião endoscópico transoral especialista não estiver disponível. O tratamento cirúrgico convencional e não cirúrgico fornece resultados oncológicos comparáveis. Evidência e recomendação 1C.


- Para casos selecionados de CEC de orofaringe T3, TORS ou TLM podem ser indicados, dependendo da necessidade de reconstrução do palato mole. A cirurgia aberta convencional pode ser indicada para pacientes com CEC de orofaringe T3-4a que não são passíveis de quimiorradiação com cisplatina em altas doses, mas que estão aptos para um procedimento cirúrgico de grande porte com reconstrução e tratamento adjuvante, com uma expectativa razoável de resultados funcionais favoráveis. Evidência e recomendação 3C.


- Pacientes com CEC de orofaringe e pescoço negativo, tratados primariamente com cirurgia, devem receber, pelo menos, dissecções de níveis II-IV. Ainda não foi alcançado um consenso absoluto, mas o nível I pode ser omitido em casos selecionados. O status de HPV ou p16 ainda não requer modificação desta indicação. Evidência e recomendação 4.C.


- Independentemente do status do HPV, o esvaziamento cervical eletivo bilateral é recomendado para todos os casos de CEC de orofaringe que se estendem ou se aproximam da linha média. Para tumores lateralizados que envolvem a base da língua, o palato mole e a parede posterior da faringe, o esvaziamento cervical bilateral eletivo deve ser considerado devido à drenagem linfática contralateral. Evidência e recomendação 4C.



LARINGE


- Tanto a cirurgia quanto a radioterapia estão indicadas para o CEC de laringe T1 e T2, e ambas apresentam resultados oncológicos semelhantes. Em geral, a cirurgia, especialmente a ressecção transoral a laser (se for tecnicamente possível), proporciona baixa taxa de recorrência local e alta taxa de preservação laríngea; entretanto, a radioterapia pode oferecer melhores resultados vocais. A escolha da modalidade de tratamento para esses tumores deve ser discutida com o paciente- Evidência e recomendação 1C.


- Quando o tratamento cirúrgico é considerado, o tratamento cirúrgico preferido para o CEC laríngeo T1b é a ressecção transoral a laser. Em pacientes com exposição inadequada, a laringectomia vertical frontolateral também é uma opção – Evidência e recomendação 1B.


- As indicações atuais para laringectomias parciais abertas são tumores laríngeos com exposição transoral inadequada e certos tumores da comissura anterior com extensão vertical. A laringectomia parcial deve ser usada em pacientes selecionados que necessitam de terapia cirúrgica de resgate para um tumor laríngeo recorrente ou persistente após falha da radioterapia - Evidência e recomendação 1B.



LARINGE/HIPOFARINGE


- Pacientes idosos com carcinoma de laringe devem ser tratados com intenção curativa. Devem ser considerados o seu estado geral e de saúde, bem como o estágio da doença. A idade cronológica em si não é motivo para tratar os pacientes idosos de maneira diferente; entretanto, os idosos geralmente são afetados por mais comorbidades do que os pacientes mais jovens e são propensos a mais complicações pós-operatórias. Uma avaliação pré-operatória cuidadosa e uma comunicação adequada com o paciente são essenciais. – Evidência e recomendação 4B.


- O tratamento não cirúrgico de preservação de órgãos deve ser realizado em casos selecionados de CEC de laringe ou hipofaringe, idealmente, em pacientes nos quais uma laringectomia parcial não é possível e em pacientes com tumores em estágio T3 e estágio T4a de baixo volume com laringe preservada, mas candidatos à laringectomia total. A laringectomia total está indicada em casos de disfunção laríngea, tumores extensos e altamente infiltrativos com invasão grosseira da cartilagem e extravasamento extralaríngeo, e falha local após protocolos não cirúrgicos de preservação de órgãos. As prioridades do paciente devem ser sempre respeitadas - Evidência e recomendação 1B.  


- Para tumores supraglóticos de estágio T1 e T2 N0 em bandas ventriculares ou ventrículos e tumores que não se aproximam da linha média, recomenda-se esvaziamento cervical eletivo ipsilateral de pelo menos níveis IIA e III - Evidência e recomendação 2B.


- Para tumores supraglóticos N0 em estágio T1 e T2 na epiglote ou prega ariepiglótica e tumores que se aproximam da linha média, recomenda-se esvaziamento cervical eletivo bilateral de pelo menos níveis IIA e III - Evidência e recomendação 2B.


- Para tumores supraglóticos estádio T3 e T4 N0, recomenda-se esvaziamento cervical eletivo bilateral de níveis IIa, III e IV, e dissecção do compartimento anterior e tireoidectomia devem ser consideradas nos casos com extensão para o espaço paraglótico. Evidência e recomendação 1A.


- Dissecção do compartimento central (nível VI) e tireoidectomia com preservação das glândulas paratireoides ou autotransplante devem ser realizadas nos seguintes pacientes com câncer de laringe e/ou hipofaringe: (1) Extensão primária ou subglótica: dissecção do compartimento central de ambos os lados + parcial ou total tireoidectomia; (2) CEC glótico avançado (T3-T4), particularmente aqueles com envolvimento da comissura anterior, cartilagem cricóide e/ou extensão subglótica: dissecção do compartimento central ipsilateral ao lado da lesão e tireoidectomia parcial ipsilateral ou tireoidectomia bilateral e total em tumores que se estendem para ambos os lados; (3) CEC supraglótico avançado (T3-T4), principalmente aqueles com comprometimento do ventrículo/espaço paraglótico, comissura anterior e/ou com metástases linfonodais no compartimento lateral do pescoço: dissecção do compartimento central ipsilateral ao lado da lesão e ipsilateral tireoidectomia parcial ou tireoidectomia bilateral e total em tumores que se estendem para ambos os lados; (4) CEC hipofaríngeo: dissecção do compartimento central ipsilateral ao lado da lesão ou bilateral em tumores que se estendem para ambos os lados. Evidência e recomendação 1B.



RECONSTRUÇÃO/REABILITAÇÃO


- A reconstrução com retalho livre é indispensável quando há necessidade de cobertura de estruturas vitais, principalmente na ausência de retalhos locais ou regionais confiáveis ​​como alternativas. O cirurgião deve considerar a reconstrução com retalho livre para mandibulectomia segmentar anterior, após maxilectomia sem prótese obturadora, para cobrir implantes, nos casos de falha da reconstrução com outros retalhos regionais ou locais, e obter os melhores resultados funcionais e estéticos - Evidência e recomendação 4C.


- A reconstrução faríngea é necessária quando há defeito circunferencial ou quando o fechamento primário resultará em estenose que pode aumentar o risco de formação de fístula salivar, principalmente em cirurgias de resgate. A interposição de retalho muscular sobre a linha de sutura também poderia ser realizada para reduzir o risco de complicações pós-operatórias maiores, principalmente em operações de resgate - Evidência e recomendação 1B.


- Todos os pacientes devem receber reabilitação fonatória após laringectomia total. A prótese fonatória valvulada é o melhor método para obter melhor qualidade e fluência da fala. A eletrolaringe é uma opção para reabilitação imediata, e a fala esofágica também pode ser tentada, principalmente quando não há outro recurso disponível - Evidência e recomendação 4B.



Referência do estudo


Matos LL, Kowalski LP, Chaves ALF, de Oliveira TB, Marta GN, Curado MP, de Castro Junior G, Farias TP, Bardales GS, Cabrera MA, Capuzzo RC, de Carvalho GB, Cernea CR, Dedivitis RA, Dias FL, Estefan AM, Falco AH, Ferraris GA, Gonzalez-Motta A, Gouveia AG, Jacinto AA, Kulcsar MAV, Leite AK, Lira RB, Mak MP, De Marchi P, de Mello ES, de Matos FCM, Montero PH, de Moraes ED, de Moraes FY, Morais DCR, Poenitz FM, Poitevin A, Riveros HO, Sanabria Á, Ticona-Castro M, Vartanian JG, Viani G, Vines EF, William Junior WN, Conway D, Virani S, Brennan P; HEADSpAcE Consortium. Latin American Consensus on the Treatment of Head and Neck Cancer. JCO Glob Oncol. 2024 Apr;10:e2300343. 



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